A existência histórica de Jesus Cristo é um dos tópicos mais debatidos entre estudiosos, teólogos e historiadores. Uma das fontes mais citadas nesse debate são os escritos de Flávio Josefo, um historiador judeu do século I. Mas até que ponto os relatos de Josefo podem ser considerados evidências confiáveis da existência de Jesus?
Vamos explorar essa questão examinando as principais passagens de seus escritos, que mencionam Jesus e outras figuras do Novo Testamento.
Em um estudo anterior já abordamos a principal citação de Flávio Josefo sobre Jesus, o “Testimonium Flavianum,” encontrada em “Antiguidades Judaicas” 18.3.3.
Neste novo estudo, vamos abordar principalmente a segunda citação de Flávio Josefo a Jesus Cristo e estender nossa pesquisa a outras citações também importantes ao contexto do “Jesus Histórico Bíblico.”
Caso queira saber mais sobre o Testimonium Flavianum, citação polêmica amplamente debatida no estudo anterior, basta conferir a publicação: As provas da existência de Jesus Cristo e as polêmicas citações de Flávio Josefo.
Você também pode ler todos os capítulos dessa série clicando nos links a seguir:
- Capítulo 01 – As provas concretas da existência de Jesus Cristo.
- Capítulo 02 – Jesus Cristo existiu? Entenda porque o Novo Testamento pode ser a prova concreta disso.
- Capítulo 03 – Existem evidências da existência de Jesus Cristo fora da Bíblia?
- Capítulo 04 – Jesus Cristo e os registros históricos que comprovam a sua existência.
- Capítulo 05 – Jesus Cristo, comprovado até por seus inimigos.
- Capítulo 06 – As provas da existência de Jesus Cristo e as polêmicas citações de Flávio Josefo.
- Capítulo 07 – Os escritos de Flávio Josefo podem comprovar a existência de Jesus Cristo?
- Capítulo 08 – Referências Históricas a Jesus Cristo e aos Cristãos nos Escritos de Suetônio.
Flávio Josefo menciona a morte de Tiago, irmão de Jesus.
Em sua obra “Antiguidades Judaicas” Flávio Josefo além de mencionar a passagem polêmica do “Testimonium Flavianum,” também faz menção a Morte de Tiago, irmão de Jesus, em outra porção do seu texto.
Flávio Josefo escreve que Anano ( Ananus, ou Ananias), sumo sacerdote por um breve período, em 62 d.C., assumiu o cargo após a morte de seu irmão Eleazar ben Ananus. Este Anano era filho de Anás, uma figura influente mencionada no Novo Testamento. Anás é o sogro de Caifás que aparece em Lucas 3:2, João 18:13 e Atos 4:6, e também em João 18:13. É Anano que vai mandar matar “Tiago irmão de Jesus chamado Messias,” conforme Josefo escreve no texto a seguir:
“Assim pois, tendo refletido sobre este tipo de gente, Anano, que dispunha de uma ocasião favorável, pois Festo havia morrido e Albino estava à caminho, convocou uma reunião de juízes e levou até ele o irmão de Jesus, chamado Messias, de nome Tiago, além de alguns outros. Os acusou de terem transgredido a Lei e os entregou para que fossem apedrejados”. (Flávio Josefo, Antiguidades Judaicas, Livro 20, Capítulo 9, Seção 1).
Nesta simples narrativa de Josefo temos uma referência bem clara a Jesus. Percebemos que ele era chamado de Cristo ou Messias por seus seguidores e que ele tinha um irmão chamado Tiago, que também é referenciado assim no Novo Testamento (Gálatas 1:18-19).
Embora muitos contestem o texto de Josefo “Testimonium Flavianum,” acusando-o de ser falso, ou interpolado posteriormente, esta outra citação a Jesus e a seu irmão Tiago, praticamente não é contestada, havendo um certo consenso por parte dos estudiosos de que ela seja provavelmente verdadeira. Além do mais, existem referências semelhantes a morte de Tiago também mencionadas por Clemente de Alexandria (150 d.C. e 215 d.C), e Hegésipo (110-140 d.C.), que se assemelham ao que Flávio Josefo escreveu.
Neste caso temos o texto de Josefo, escrito provavelmente entre os anos 93 e 94 d.C., o que seria aproximadamente 60 anos após a morte de Jesus, e os textos de Clemente e Hegésipo escritos alguns anos após Josefo.
É importante mencionarmos esta diferença de tempo porque, embora Josefo tenha mencionado Jesus e seu irmão Tiago em sua obra, a distância temporal e o contexto cultural podem afetar a interpretação e a compreensão dessas referências. No entanto, como o texto de Josefo é tão próximo a Jesus, podemos observar que isso não ocorreu e ainda temos os escritos de Clemente e Hegésipo que corroboram com Flávio Josefo. Dessa forma, é possível não só reconhecermos que Jesus realmente existiu, mas que também teve um irmão chamado Tiago, que foi morto conforme foi registrado nos textos de Flávio Josefo. Esta descrição do historiador também nos serve como forma de validação da narrativa bíblica já que se encaixa perfeitamente com aquilo que sabemos sobre Jesus.
Flávio Josefo menciona João Batista, profeta e parente de Jesus Cristo.
Também em “Antiguidades Judaicas,” de autoria de Flávio Josefo, encontramos uma citação detalhada sobre o Profeta João Batista, filho de Isabel, prima de Maria, mãe de Jesus.
No texto, Josefo narra a prisão de João Batista e os motivos pelos quais ela teria ocorrido. A narrativa de Josefo difere um pouco dos textos do Novo Testamento, como podemos conferir:
“Agora, alguns dos judeus pensaram que a destruição do exército de Herodes veio de Deus, e que foi muito justa, como uma punição contra o que ele fez contra João, chamado Batista. Pois Herodes o havia matado, embora ele fosse um homem bom, e ordenasse aos judeus que exercessem virtude, tanto na justiça uns com os outros quanto na piedade para com Deus, e assim viessem para o batismo. Pois a lavagem (com água) seria aceitável para Deus, se usada não para a remissão de alguns pecados, mas para a purificação do corpo; supondo ainda que a alma já estivesse purificada por meio da justiça. Ora, quando muitos outros vieram em multidões ao redor dele, pois estavam muito satisfeitos com as suas palavras, Herodes, que temia que tal influência sobre as pessoas pudesse levar a alguma sedição e rebelião, (pois pareciam prontos para fazer qualquer coisa que ele aconselhasse), acreditava que seria melhor preveni-lo antes que qualquer tentativa desse tipo fosse feita por ele, e pensou que, ao matá-lo, poderia evitar qualquer mal que ele poderia causar, e não trazê-lo vivo ao tribunal, para ser acusado. Portanto, ele foi enviado como prisioneiro, em consequência da suspeita de Herodes, para Machaerus, o castelo que eu mencionei antes, e lá foi morto.” (Antiguidades Judaicas 18.5.2 (116-119)).
Basicamente o que encontramos neste texto de Josefo é o registro claro de um personagem bíblico morrendo da mesma maneira que a Bíblia descreve.
Também temos um João Batista respeitado pelo povo e visto como um profeta. Tão reconhecido como profeta de Deus que os próprios judeus mencionados veem a destruição dos exércitos de Herodes como um tipo de punição divina por ele ter mandado matar o profeta.
O texto também menciona a pregação de João que “ordenava aos judeus que exercessem virtude, tanto na justiça uns com os outros quanto na piedade para com Deus,” como também fala do ato de batizar.
As únicas diferenças entre os escritos de Flávio Josefo e a narrativa bíblica se encontram na motivação da morte de João, pois Josefo dá a entender que a motivação para sua execução foi política, enquanto a Bíblia nos afirma que foi por que João Batista condenava publicamente o casamento de Herodes com Herodias.
Outro ponto que Josefo menciona é que o batismo de João não era para a remissão de pecados, enquanto os Evangelhos afirmam exatamente o oposto (Marcos 1:4).
De acordo com Frederick Fyvie Bruce, professor, escritor, erudito da Bíblia, e um dos fundadores da moderna compreensão evangélica das Escrituras, é possível que Herodes tenha visto a prisão de João como uma oportunidade de resolver dois problemas simultaneamente.
Sobre a divergência a respeito do batismo, Bruce argumenta que os evangelhos oferecem um relato mais plausível do ponto de vista “histórico-religioso” e, sendo mais antigos que a obra de Josefo, provavelmente são mais precisos.
É importante frisar aqui que, até o fato do texto de Flávio Josefo não ser igual ao que se encontra nas Escrituras Bíblicas neste caso em especifico, é algo muito favorável, visto que isso comprovaria que o relato de Josefo não teria sofrido uma interpolação cristã, já que cristãos não alterariam a história de João Batista dessa maneira a fim de contradizer a Biblia e tradição cristã. Isso sugere a autenticidade do relato de Josefo.
Em sua essência, o relato de Josefo corrobora ao dos Evangelhos ao confirmar a existência de João Batista, sua pregação e batismo, seu status de profeta de Deus e também sua execução por ordem de Herodes Antipas, filho de Herodes, o Grande.
Flávio Josefo também menciona pessoas e o contexto histórico dos tempos de Jesus.
Além de mencionar Jesus Cristo, Tiago irmão de “Jesus chamado o Cristo,” e o Profeta João Batista, Flávio Josefo também menciona inúmeras outras pessoas importantes e acontecimentos, também registrados no Novo Testamento.
Ao cruzarmos os relatos de Flávio Josefo e do Novo Testamento, é possível ver que ambos fornecem informações complementares sobre figuras históricas e eventos do primeiro século na Judeia. Isso não só valida a historicidade de muitos personagens e acontecimentos bíblicos, mas também enriquece nossa compreensão do contexto em que ocorreram.
Relato de Josefo sobre Pôncio Pilatos:
Antiguidades Judaicas 18.3.1: “Mas Pilatos, que era procurador da Judeia, enviou por ordem de César estátuas de César para Jerusalém.”
Antiguidades Judaicas 18.4.2: “Agora, havia por volta deste tempo Jesus, um homem sábio… Quando Pilatos, por sugestão dos homens principais entre nós, o condenou à cruz, aqueles que o amaram desde o princípio não deixaram de amá-lo.”
Relato Bíblico sobre Pôncio Pilatos:
Pilatos é mencionado nos Evangelhos como o governador romano que condenou Jesus à crucificação (Mateus 27:2, Marcos 15:1, Lucas 23:1, João 18:29).
Ambos os relatos mencionam Pilatos como o governador responsável pela crucificação de Jesus. Josefo menciona a condenação de Jesus sob a sugestão dos líderes judeus, o que se alinha com a narrativa bíblica.
Relato de Josefo sobre Herodes, o Grande:
Antiguidades Judaicas 17.6.4: “Mas, durante a celebração do festival de Páscoa, uma insurreição começou entre os soldados de Herodes.”
Relato no Novo Testamento sobre Herodes, o Grande:
Herodes é mencionado em Mateus 2:1-19 como o rei que ordenou a matança dos inocentes após o nascimento de Jesus.
Relato de Josefo sobre Herodes Agripa I:
Antiguidades Judaicas 19.8.2: “Herodes Agripa, que começou a reinar no décimo quarto ano do reinado de César, ordenou que Tiago, o irmão de João, fosse morto por causa de suas atividades.”
Relato Bíblico sobre Herodes Agripa I:
Herodes Agripa I é mencionado em Atos 12:1-23 como o rei que perseguiu os apóstolos e ordenou a execução de Tiago, irmão de João.
Ambos os relatos mencionam a execução de Tiago, irmão de João, por ordem de Herodes Agripa I, e a perseguição dos cristãos.
Relato de Josefo sobre Félix:
Antiguidades Judaicas 20.8.5: “Félix capturou Eleazar, o arquiladrão, que durante vinte anos havia estado saqueando o país dos judeus e levou-o a Roma.”
Relatos sobre Félix no Novo Testamento:
Félix é mencionado em Atos 23:24-26:27 como o procurador romano que ouviu as acusações contra Paulo.
Relato de Josefo sobre Festo:
Antiguidades Judaicas 20.8.9: “Festo enviou homens armados para a torre Antonia para atacar aqueles que tinham começado a revolta.”
Relato sobre Festo no Novo Testamento:
Festo é mencionado em Atos 24:27-26:32 como o sucessor de Félix e o procurador que também ouviu o caso de Paulo.
Relato de Josefo sobre César Augusto:
Antiguidades Judaicas 18.2.2: “Quando Cyrenius tinha governado a Síria e a Judeia, ele fez um censo que incluiu os bens dos judeus.”
Relato no Novo Testamento sobre César Augusto:
César Augusto é mencionado em Lucas 2:1 como o imperador romano que ordenou o censo que levou José e Maria a Belém.
Relato de Josefo sobre Tibério César:
Antiguidades Judaicas 18.3.2: “Pilatos, por ordem de Tibério, enviou soldados vestidos como civis com dardos escondidos em suas vestes.”
Relato do Novo Testamento sobre Tibério César:
Tibério César é mencionado em Lucas 3:1 como o imperador romano durante o início do ministério de João Batista.
Relato de Josefo sobre Caifás:
Antiguidades Judaicas 18.4.3: “Ele nomeou outro sumo sacerdote, chamado José, que foi chamado Caifás.”
Relato sobre Caifás no Novo Testamento:
Caifás é mencionado em Mateus 26:3-57, João 11:49-53, como o sumo sacerdote que presidiu o julgamento de Jesus.
Relato de Josefo do Contexto Sociopolítico:
Josefo descreve detalhadamente o contexto sociopolítico da Judeia, incluindo rebeliões, censos e a administração romana.
Relato Bíblico do Contexto Sociopolítico:
Os Evangelhos e Atos dos Apóstolos também mencionam o contexto sociopolítico, como o censo ordenado por César Augusto (Lucas 2:1) e os tumultos durante o julgamento de Jesus (Mateus 27:24).
Ambos os relatos fornecem um pano de fundo histórico detalhado que ajuda a entender melhor o ambiente em que os eventos bíblicos ocorreram.
Conclusão:
Quando citamos os escritos de Josefo, ou de outros escritores não cristãos, sabemos que estes escritos não podem ser considerados de forma unânime provas conclusivas da existência de Jesus Cristo, mas reconhecemos que eles fornecem evidências significativas que corroboram os relatos do Novo Testamento.
O fato de termos textos primários como os do Novo Testamento, textos secundários dos Pais da Igreja e ainda fontes não cristãs, corroborando para a existência de Jesus Cristo no primeiro século e todo um contexto de acontecimentos, personagens, locais e ainda incontáveis artefatos arqueológicos, este conjunto de fatores nos deixa claro que Jesus existiu. Negar isso é negar a verdade e desacreditar do Método Histórico Critico ou de qualquer outro método usado por historiadores para determinar se alguém existiu ou não.
É preciso lembrar então, que ainda que os céticos discordem, o Novo Testamente é sem sobra de duvidas a fonte primária que comprova a existência de Jesus Cristo, pois é o relato de testemunhas oculares que viveram com Ele, ouviram suas palavras e as registraram. Não existe como negar essa autoridade para o Novo Testamento.
O fato de Josefo registrar eventos, personagens, acontecimentos e até a existência do próprio Jesus é apenas mais um alicerce que nos mostra o quanto a Bíblia é de uma fidelidade histórica notável.
Você também pode ler todos os capítulos dessa série clicando nos links a seguir:
- Capítulo 01 – As provas concretas da existência de Jesus Cristo.
- Capítulo 02 – Jesus Cristo existiu? Entenda porque o Novo Testamento pode ser a prova concreta disso.
- Capítulo 03 – Existem evidências da existência de Jesus Cristo fora da Bíblia?
- Capítulo 04 – Jesus Cristo e os registros históricos que comprovam a sua existência.
- Capítulo 05 – Jesus Cristo, comprovado até por seus inimigos.
- Capítulo 06 – As provas da existência de Jesus Cristo e as polêmicas citações de Flávio Josefo.
- Capítulo 07 – Os escritos de Flávio Josefo podem comprovar a existência de Jesus Cristo?
- Capítulo 08 – Referências Históricas a Jesus Cristo e aos Cristãos nos Escritos de Suetônio.
Fontes pesquisadas:
(GEISLER, Norman, Não tenho fé suficiente para ser ateu – Vida, 2006, pp.227),
Josefo, F. (93-94 d.C./2009). Antiguidades Judaicas (Livro 18, Capítulo 5, Seção 2). Em W. Whiston (Trad.), The Works of Josephus: Complete and Unabridged. Hendrickson Publishers.
Josefo, Flávio. Antiguidades Judaicas. Traduzido por William Whiston. Hendrickson Publishers, 2009.
STROBEL, Lee. Em defesa de Cristo: um jornalista ex-ateu investiga as provas da existência de Cristo. São Paulo: Editora Vida, 2001.
MCDOWELL, Josh. Merece Confiança o Novo Testamento? São Paulo: Vida Nova, 1965.
Flávio Josefo, Seleções de Flávio Josefo, Editora das Américas, 1974, tradução de P. Vicente Pedroso.
JOSEFO, Flávio. História dos hebreus. Rio de Janeiro, CPAD, 1991, 2, p. 203. V. tb. YAMAUCHI, Edwin. Josephus and the Scriptures. Fides et historia 13, 1980, p. 42-63.