Escatologia: O Estudo das Últimas Coisas, através da História.

O que é Escatologia? Como ela surgiu, o que estuda e como chegou até nós?

Neste estudo introdutório, vamos transmitir um conteúdo vasto, rico, direto e completo sobre o surgimento e desenvolvimento da Escatologia Bíblica. Este é o ponto de partida para aqueles que desejam começar a estudar Escatologia de forma aprofundada e descomplicada desde o começo.

Ao final deste conteúdo, você terá uma visão abrangente da Escatologia e saberá, inclusive, o que os antigos cristãos sabiam sobre a Escatologia em seu tempo, quais ideias e interpretações eles aceitavam e como essas ideias e interpretações foram evoluindo e se expandindo com o passar do tempo, à medida que o conhecimento cristão foi aumentando.

Vamos entender também do que se trata a Escatologia Bíblica e começar a explanar as suas principais áreas.

Este estudo é o primeiro de uma série de artigos da série “Escatologia Descomplicada”, onde vamos estudar sistematicamente inúmeras áreas, interpretações, cronologias bíblicas e profecias sobre os tempos do fim.

Você também pode ler a nossa série de publicações sobre Escatologia e Profecias Bíblicas aqui no Pesquisador Cristão clicando nos links a seguir:

O que é Escatologia e como ela surgiu?

O que é Escatologia?

A Escatologia é uma área fascinante e profunda da teologia cristã que examina as “últimas coisas” da perspectiva bíblica. Desde suas raízes no Antigo Testamento até suas complexas interpretações teológicas modernas, a escatologia oferece uma visão rica e inspiradora do destino final da humanidade e do mundo, convidando os crentes a viverem com esperança, propósito e vigilância espiritual.

A escatologia surgiu como uma resposta às promessas bíblicas, às esperanças messiânicas e às necessidades pastorais dos crentes em tempos de perseguição e sofrimento.

De onde vem o termo Escatologia?

O termo “escatologia” vem do grego “eschatos” (ἔσχατος), que significa “último” ou “final”, e “logia” (λογία), que significa “estudo” ou “discurso”. Portanto, escatologia literalmente significa “o estudo das últimas coisas”.

Ao longo dos séculos, a escatologia cristã foi se desenvolvendo através dos escritos dos Pais da Igreja, teólogos medievais, reformadores protestantes e teólogos modernos. Cada período histórico trouxe novas interpretações e entendimentos sobre os eventos finais e profecias descritas na Bíblia.

Atualmente, a Escatologia Bíblica está bem organizada e se desenvolveu em uma rica e diversificada área de estudo teológico, abordando questões fundamentais sobre o fim dos tempos, o julgamento final e o destino eterno da humanidade.

 

Escatologia Bíblica através da História – Dos Pais da Igreja à Era Medieval.

Sempre foi importante para os cristãos da Igreja Primitiva o estudo e entendimento das profecias bíblicas, principalmente aquelas que se referem ao final dos tempos e à segunda vinda de Cristo.

Escatologia na Igreja Primitiva (Século I):

A ideia cristã de um “Final dos Tempos” está presente desde o Sermão do Monte das Oliveiras proferido por Jesus e registrado pelos escritores dos Evangelhos (Mateus 24, Marcos 13, Lucas 21). Após o Sermão do Monte, temos os textos das cartas de Paulo (1 e 2 Tessalonicenses), que abordam a segunda vinda de Cristo, e o livro de Apocalipse, escrito pelo apóstolo João, que é uma das obras centrais para a escatologia cristã.

Escatologia nos Estudos dos Pais da Igreja (Século II ao V):

Pintura retratando o martírio de Inácio de Antioquia.
Pintura retratando o martírio de Inácio de Antioquia.

Encontramos a primeira referência ao termo “Escatologia” nos escritos de Inácio de Antioquia, um dos Pais da Igreja e bispo de Antioquia na Síria entre os anos 68 e 107 d.C. Inácio de Antioquia foi discípulo direto do apóstolo João, autor do livro de Apocalipse, e também teve contato com o apóstolo Paulo e recebeu sua consagração diretamente de Pedro. Seu ministério terminou com o martírio no Coliseu romano, onde foi devorado por leões.

Após a morte de Inácio, os estudos da Escatologia continuaram a se desenvolver através do apologista cristão Justino Mártir, teólogo do século II. Justino foi um dos primeiros a defender a crença em um milênio literal, com Cristo reinando na Terra por mil anos. Em seguida, os estudos da Escatologia Bíblica chegaram ao Ocidente através de Tertuliano (c. 160-225), um proeminente apologista cristão e teólogo cartaginês que escreveu sobre a ressurreição dos mortos e a segunda vinda de Cristo, mantendo uma visão pré-milenista.

Posteriormente, os estudos da Escatologia se expandiram no Oriente através do teólogo Orígenes de Cesareia (c. 185-254), conhecido por sua abordagem mais alegórica e menos literal da escatologia, influenciando a interpretação amilenista.

Durante a era dos Pais da Igreja, a Escatologia foi estudada por diversos teólogos, bispos, apologistas e escritores cristãos influentes, como Papias de Hierápolis (c. 60-130 d.C.), um dos primeiros líderes da Igreja Cristã, que defendia fervorosamente um milênio literal onde Cristo reinaria na Terra, interpretando o Apocalipse de João de maneira literal.

Irineu de Lyon (c. 130-202 d.C.), um importante teólogo cristão do século II, discípulo de Policarpo, que por sua vez foi discípulo do apóstolo João, também defendeu a visão pré-milenista, acreditando que Cristo retornaria antes de um reinado literal de mil anos.

Hipólito de Roma (c. 170-235 d.C.), teólogo e escritor cristão do início do século III, escreveu extensivamente sobre a escatologia, incluindo temas como o anticristo, a tribulação e o reinado milenar de Cristo.

Cipriano de Cartago (c. 200-258 d.C.), bispo cristão e escritor do século III, abordou temas escatológicos, enfatizando a necessidade de vigilância e preparação para a segunda vinda de Cristo.

Lactâncio (c. 250-325 d.C.), escritor e teólogo cristão da Antiguidade Tardia, escreveu sobre a escatologia, incluindo a segunda vinda de Cristo e o julgamento final, mantendo uma visão pré-milenista.

Eusébio de Cesareia (c. 260-339 d.C.), historiador cristão e bispo do século IV, escreveu sobre a história da igreja e eventos escatológicos, embora sua abordagem fosse mais histórica do que especulativa.

Agostinho de Hipona, conhecido como “Santo Agostinho”, influente filósofo e teólogo cristão latino dos séculos IV e V, desenvolveu a interpretação amilenista, onde o milênio é visto como um simbolismo do reinado espiritual de Cristo desde sua ascensão até o fim dos tempos.

Escatologia no Período Medieval (Século VI ao XV):

Após o século V, ocorreu o desenvolvimento da Teologia Escolástica, um período em que a teologia floresceu na Europa medieval, especialmente entre os séculos XII e XVI. Neste período, muitos teólogos produziram estudos sobre Escatologia e fim dos tempos. Um exemplo notável é Tomás de Aquino, que continuou a desenvolver a teologia escatológica, com ênfase na escatologia pessoal (morte, julgamento individual, céu e inferno) mais do que na escatologia cósmica.

 

Escatologia Bíblica através da História – Da Reforma Protestante aos nossos dias.

Escatologia dos reformadores
Muro dos Reformadores em Genebra, na Suíça.

A escatologia cristã evoluiu significativamente desde a Reforma, refletindo mudanças teológicas, culturais e históricas ao longo dos séculos. A diversidade de interpretações continua a enriquecer o debate teológico e a compreensão das “últimas coisas” entre os cristãos de diferentes tradições e contextos.

Escatologia dos Reformadores (Século XVI):

Os principais reformadores, Martinho Lutero (1483-1546) e João Calvino (1509-1564), não produziram muito conteúdo escatológico detalhado. Lutero, embora não tenha se aprofundado extensivamente na escatologia, acreditava na iminência da segunda vinda de Cristo e via a Igreja Católica Romana como a personificação do Anticristo, refletindo a turbulência religiosa de sua época. João Calvino, similarmente, não especulava detalhadamente sobre os eventos finais, mas firmemente acreditava no retorno de Cristo, no julgamento final e na ressurreição dos mortos.

Escatologia dos Pós-Reformadores e Puritanismo (Século XVII):

Alguns teólogos pós-reforma, especialmente entre os puritanos, promoveram o pós-milenismo, a crença de que Cristo retornará após um período de mil anos de paz e justiça, introduzido gradualmente pela pregação do evangelho e reforma moral. John Owen e Jonathan Edwards são exemplos de teólogos que defenderam uma visão pós-milenista, esperando que a igreja fosse um agente de transformação para o estabelecimento do reino de Deus na Terra.

Escatologia no Período Moderno, o surgimento do Arrebatamento pré-tribulacionista e outras interpretações (Século XVIII – XIX):

O Iluminismo trouxe uma visão mais cética e racionalista da religião, afetando também a escatologia. Houve uma tendência a interpretar textos escatológicos de forma mais alegórica ou simbólica. William Miller previu a segunda vinda de Cristo para 1844, evento que levou à formação do movimento Adventista após a “Grande Decepção”, enfatizando a iminência do retorno de Cristo.

John Nelson Darby desenvolveu a teologia dispensacionalista, que divide a história sagrada em diferentes dispensações e introduziu a ideia do arrebatamento pré-tribulacionista, onde os crentes seriam levados antes de um período de tribulação de sete anos.

Escatologia nos nossos dias (Século XX – XXI):

O dispensacionalismo se popularizou, especialmente nos Estados Unidos, através de publicações influentes como a Bíblia de Estudo Scofield, incluindo um arrebatamento pré-tribulacionista, uma tribulação de sete anos e um milênio literal. Movimentos Carismáticos e Pentecostais frequentemente enfatizam a iminência da segunda vinda de Cristo e a preparação espiritual para este evento.

Em contraste, a Teologia da Libertação na América Latina reinterpretou a escatologia, enfatizando a libertação dos pobres e oprimidos como sinal do reino de Deus em ação no presente, ao invés de focar exclusivamente em eventos futuros.

Hoje, há uma ampla variedade de perspectivas escatológicas entre os cristãos. Além do dispensacionalismo, muitas igrejas mantêm visões amilenistas ou pós-milenistas. Obras como a série “Deixados para Trás” (Left Behind) ajudaram a popularizar o dispensacionalismo entre o público em geral, refletindo e influenciando o interesse popular em temas escatológicos.

No Brasil, a grande maioria dos cristãos pentecostais, neopentecostais e até algumas igrejas históricas reformadas adotam o dispensacionalismo, pregando o arrebatamento pré-tribulacionista e outras interpretações comuns a essa linha de pensamento.

 

Escatologia Bíblica no Antigo e no Novo Testamento.

Muitos pensam que a Escatologia se restringe ao estudo do livro de Apocalipse, mas isso não é verdade. Embora Apocalipse seja central no estudo escatológico, outros livros e cartas da Bíblia também contribuem significativamente para essa área da teologia.

É importante notar que aproximadamente 25% do conteúdo da Bíblia é profético. No Antigo Testamento, encontramos 18 livros proféticos, como Isaías, Jeremias, Ezequiel, Daniel, entre outros. Esses livros não apenas contêm profecias específicas, mas também simbolismos que são relevantes para o estudo escatológico. Profetas como Isaías, Daniel, Ezequiel e Zacarias discutem o “dia do Senhor”, um período de julgamento e restauração, frequentemente através de visões apocalípticas e profecias sobre o futuro de Israel e do mundo.

No Novo Testamento, a escatologia é ainda mais desenvolvida. Jesus Cristo discutiu extensivamente sobre o fim dos tempos, especialmente no Sermão do Monte das Oliveiras (Mateus 24, Marcos 13, Lucas 21). Os apóstolos também trataram de temas escatológicos em suas cartas. O livro de Apocalipse, escrito pelo apóstolo João, é central na escatologia cristã, apresentando visões apocalípticas detalhadas sobre o fim do mundo e a instauração do reino de Deus.

 

A Escatologia Bíblica é difícil de ser entendida?

A Escatologia Bíblica pode parecer inicialmente complexa devido à sua fragmentação em várias áreas de estudo, que abrangem uma ampla gama de temas relacionados às profecias bíblicas e às diferentes visões teológicas que surgiram ao longo do tempo. É comum nos depararmos com termos como Pré-Milenismo, Pós-Milenismo, Amilenismo, Dispensacionalismo, entre outros, que podem parecer estranhos e confusos para quem está começando a estudar o assunto.

No entanto, à medida que mergulhamos mais fundo na Escatologia Bíblica, percebemos que esses termos são parte de uma organização sistemática que nos ajuda a entender profecias específicas e diversas interpretações teológicas. Cada termo e corrente teológica serve para nomear diferentes perspectivas sobre eventos futuros, como o Arrebatamento, a Tribulação, o Milênio, entre outros aspectos escatológicos.

É importante destacar que, dentro dessa diversidade de interpretações, existem ideias distorcidas e interpretações heréticas que devem ser discernidas à luz do conhecimento bíblico sólido. Estudar Escatologia de maneira gradativa, começando do básico e avançando para interpretações mais complexas, é fundamental para um entendimento completo e equilibrado do assunto.

Portanto, o melhor caminho para compreender a Escatologia é começar pelo seu conceito fundamental, entender seu surgimento histórico e desenvolvimento ao longo dos séculos, para então explorar as diferentes correntes interpretativas e suas bases bíblicas. Essa abordagem gradual ajuda a construir um entendimento sólido e coerente sobre as “últimas coisas” conforme reveladas na Escritura.

 

Quais os principais assuntos estudados pela Escatologia?

Escatologia Bíblica

O conteúdo escatológico encontrado na Bíblia é bem abrangente, conforme já mencionamos anteriormente. Se fossemos listar de maneira organizada os principais pontos que são alvo do estudo escatológico, podemos mencionar de início os seguintes:

  1. Segunda Vinda de Cristo (Parousia):

O retorno de Jesus Cristo à Terra e os sinais da segunda vinda, cronologia dos eventos, e impacto global.

  1. Ressurreição dos Mortos:

A ressurreição dos mortos, tanto justos quanto ímpios e a natureza dos corpos ressuscitados, ressurreição corporal ou espiritual.

  1. Juízo Final:

O julgamento de todos os seres humanos por Deus.

Assuntos Relacionados e os critérios de julgamento, destino eterno (céu e inferno).

  1. Milênio:

O reinado de mil anos de Cristo mencionado em Apocalipse 20. Pré-milenismo, pós-milenismo, amilenismo.

  1. Tribulação:

Período de sofrimento intenso antes da segunda vinda de Cristo. A Grande Tribulação, os sete anos de tribulação, os julgamentos de selos, trombetas e taças.

  1. Arrebatamento:

O evento em que os crentes são levados ao encontro de Cristo nos ares. Pré-tribulacionismo, mesotribulacionismo, pós-tribulacionismo.

  1. Anticristo:

A figura que se opõe a Cristo e lidera a oposição a Deus no fim dos tempos. Identidade do Anticristo, ações e características, ligação com a besta do Apocalipse.

  1. A Besta e a Marca da Besta:

Entidades e sinais descritos no Apocalipse. Interpretação simbólica vs. literal, significado da marca da besta.

  1. Nova Jerusalém:

A cidade celestial descrita em Apocalipse 21-22. Descrição da cidade, seu significado e implicações para a vida eterna.

  1. Reino de Deus:

Estudo: A realização final do reino de Deus. Teologias do reino, manifestações presentes e futuras.

  1. Destino Eterno:

O destino final dos seres humanos. Céu, inferno, lago de fogo, novo céu e nova terra.

  1. Sinais dos Tempos:

Sinais e eventos que precedem a segunda vinda de Cristo. Guerras, desastres naturais, apostasia, evangelização mundial.

  1. Nova Criação:

A renovação de todas as coisas, incluindo o céu e a terra. Renovação cósmica, restauração do Éden, vida eterna.

  1. Eternidade:

O estado de existência após o fim dos tempos. Natureza da eternidade, experiência de viver na presença de Deus para sempre.

  1. Restauração de Israel:

A restauração do povo judeu no plano de Deus. Papel de Israel nos últimos tempos, cumprimento das promessas bíblicas.

  1. Apocalipse e Literatura Apocalíptica:

Livros e passagens bíblicas que descrevem o fim dos tempos. Interpretação de Apocalipse, Daniel, Ezequiel, e outras passagens apocalípticas.

  1. Teologias Específicas de Escatologia:

Diferentes abordagens e escolas de pensamento escatológico. Dispensacionalismo, historicismo, preterismo, futurismo, idealismo.

 

Conclusão:

A escatologia bíblica é um campo crucial da teologia cristã que estuda os eventos finais da história e o destino da humanidade conforme revelado nas Escrituras. Suas raízes estão nas promessas e profecias do Antigo Testamento, nas expectativas messiânicas e na literatura apocalíptica do período intertestamentário. Com os ensinamentos de Jesus e os escritos apostólicos, especialmente o Livro do Apocalipse, a escatologia ganhou forma e detalhes.

Ao longo dos séculos, a escatologia evoluiu, abordando questões fundamentais como a segunda vinda de Cristo, a ressurreição dos mortos, o juízo final, o milênio, a tribulação, o arrebatamento, o anticristo, a besta e a marca da besta, a Nova Jerusalém, o Reino de Deus, o destino eterno da humanidade, os sinais dos tempos, a nova criação e a restauração de Israel.

Diferentes correntes teológicas surgiram, incluindo pré-milenismo, pós-milenismo, amilenismo, dispensacionalismo, futurismo, preterismo, historicismo e idealismo, cada uma oferecendo perspectivas distintas sobre as profecias bíblicas e os eventos finais. Esses temas centrais, como a segunda vinda de Cristo, a ressurreição dos mortos e o juízo final, são cruciais para entender o propósito eterno de Deus.

A escatologia bíblica fornece uma visão abrangente do futuro, oferecendo esperança e compreensão do plano divino. Estudando esses temas, os cristãos são encorajados a viver em vigilância, fidelidade e expectativa do retorno de Cristo e da consumação de todas as coisas.

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PR. Monteiro Junior

Sou Pastor e eterno estudante de Teologia. Apaixonado pela História da Igreja e por todas as áreas importantes para o nosso crescimento espiritual. Estudo desde sempre temas ligados a Apologética, Arqueologia Bíblica e Escatologia e me dedico a ensinar e compartilhar o conhecimento deste temas.